Ela coleccionava dicionários
como outras mulheres coleccionam homens
e os põem na prateleira:
manuais, gramáticas, Aprenda Sozinho
alemão, malaio, italiano, suaíli, galês,
como uma paixão, por roupas a pendurar
sem uso no escuro,
por peridotos, granadas, ametistas, pérolas
num estojo fechado, substantivos declinados.
Cada palavra desconhecida brilhava com um fogo delicioso
e as frases estranhas ensedavam-lhe a pele
com seus géneros e conotações.
Poderia ter sido a casa dos fundos
na frente marítima em Macau
acolhendo todos os marinheiros.
Mas o desejo que muitas línguas
lhe abrissem os lábios – si, igen, ja,
ah oui, yes, sim –
foi um sorriso de despedida,
uma inclinação a favor do vento
que varre uma centelha de luz
através do mar e deixa um arrepio prateado
no pescoço. Corre para esses livros
a guardar a lareira,
confortáveis ISBNs como um correr de dias;
para o pão e a fruta, para o vinho espumante.
Ofereceram-lhe um ciclamen com perfume
um truque novo a casar a violeta com a rosa,
como se uma flor ansiasse por cantar
e o timbre rosa tremesse
em palavras mais silenciosas.
Ela tocou-lhe a polpa e soube
que iria desaparecer como o discurso
e não desapareceu.
E no entanto não era linguagem o que procurava,
nem a música de qualquer sentido.
Uma fidelidade antiga fazia-a avançar
para além dos fundamentos do pensamento
e da ideia mesma do silêncio
até à quinta temporada que iria enfim regressar
com o seu clima de reconhecimento
e as suas pontas soltas.
[Trad. H.B. 18.Nov.2011]
in Jan Owen (n.1945), “The Return: «She Collected Dictionaries»”, Poems 1980-2008. River Road Press/ John Leonard Press, 2008; aqui ou aqui