Os tigres, os leopardos, os leões
«estes monstros só atacam aqueles a quem assustam ou que conseguiram aterrorizar! »
Eliphas Lévi, A Magia dos Magos
Nos jardins reais da Assíria
passeavam-se melancólicos, serenos
os tigres, os leopardos, os leões.
nas antecâmaras, nas bibliotecas
nas câmaras em pórfiro, copulavam um pouco
nunca rugindo, nunca se enraivecendo, nunca caçando
nem de noite nem de dia
não eram perigosos nem livres
e no entanto viviam!
o que enfeitiçou assim estas criaturas
que só são dóceis quando fazem amor
e que ficaram quase domesticadas?
As sentinelas não o sabiam explicar,
nem as cortesãs, nem mesmo o rei.
Só os magos, os decifradores de estrelas,
detinham o segredo daquela docilidade.
Obcecados com a clarividência
a noite toda, temiam que os céus
traíssem os homens, que as gentes
fossem privadas das suas ligações
com o reflexo astral que tornava
dóceis as colossais criaturas
e as enchia de estranha ternura
– carnívoros a abdicarem de carne
que os tigres, os leopardos e os leões
recordem para sempre
o tempo em que foram exaltados e amados
que as energias libertadas nessa ligação astral
nunca cessem
e possa a imortalidade da luz
manter-se a força a religar-nos
a essas almas felinas.
Katica Kulavkova do livro Time Difference, 1998 – «Guião celestial», trad. de Helena Barbas