Laura de Anfriso de Manuel da Veiga Tagarro
- poesia e história - helena barbas - Maio 2003
[II – A Obra e a Crítica ]
1. Sobre Laura de Anfriso
1.1 Problemas editoriais
1.2 Aspectos prosódicos
1.3 Os mistérios da escrita
1.4 A escrita como encenação e escultura
] 1.2 Aspectos prosódicos [
A epístola é composta em terza rima – com 112 tercetos e uma quadra de rima cruzada – num total de 340 decassílabos (indicados por letra maiúscula), obedecendo à rima tradicional ABA/BCB/etc.
As éclogas I – "Ao Senhor D. Duarte" – e III – "Entrada de D. Teodósio" – são compostas por, respectivamente, 34 e 26 estrofes de 13 versos cada, em que alternam decassílabos com hexassílabos (indicados por letra minúscula), nos seguintes esquemas rimáticos: ABCBACcDeDEFF, e abCabCcdeeDfF.
A composição estrófica das outras duas éclogas é mais complexa. A écloga II – "Ao Senhor D. Teodósio" – apresenta-se em três partes: primeiramente, um grupo de 28 tercetos mais 1 quadra, em "terza rima" (introdução e apresentação dos pastores Frondoso e Salício); a estes seguem-se 12 oitavas, com a rima ABABABCC, ou oitava rima (diálogo em que os pastores alternam no louvor e pedido de regresso de D. Teodósio), que em si, constituem uma ode; para, no final, regressar à "terza rima", com 4 tercetos e uma quadra (conclusão do narrador, onde descreve os sentimentos dos pastores e faz coincidir o fim do canto com o fim do dia). Todos os versos são decassílabos.
A quarta écloga apresenta 8 estrofes de 13 versos com a rima abCabCcdeeDff, a que se seguem 133+1 em "terza rima".
A uniformidade dos metros – alternância entre decassílabo e hexassílabo – vai manter-se constante pelos livros de Odes.
Estas são, na sua grande maioria, compostas por quintilhas (32) e sextilhas (26), além de duas em novenas. Em qualquer deste tipo de estrofes os esquemas rimáticos revelam-se bastante rígidos (ababb e abbaa), nem sempre respeitando a regra da rima dupla (abacc, abcbb). A rima emparelhada no final recupera, de algum modo, o ritmo de balada, acentuado pela predominância dos decassílabos. Tagarro evita sempre a simetria especular da rima intermédia e, ao recusar este centro distributivo, transforma a quintilha num terceto acoplado de um dístico.
No que respeita às sextilhas, as rimas apresentam-se cruzadas nos quatro primeiros versos e emparelhadas nos dois últimos (aabbcc, ababcc ou abbacc), o que pode ser entendido como uma redução da oitava camoniana. As composições em estrofes de nove versos, de raízes nacionais antigas mas pouco usadas, são apenas duas e obedecendo à mesma rima: abbaaccdd.
Se se tiver em conta que a forma da ode corresponde a estrofes de oito versos (com as rimas abCabCdD ou aBaBcedC), nenhum destes poemas preenche essa condição (variam entre 5/6 e 9 versos), pelo que mereceriam antes o nome de liras [1] ou de canções aliradas [2].
A alternância de decassílabos (o metro épico) com hexassílabos (o metro bucólico), combinação recuperada no século XVI e apelidada de "heróico quebrado" - que apenas brevemente é substituída pela oitava rima - parece atestar, desde já, a partir da escolha prosódica, a particular intenção épica do autor (que se explorará no próximo ponto).
[] H.B.[]
[1] Esta forma, importada de Itália por Garcilaso de La Vega, era composta por estrofes de 5 versos, alternando o decassílabo com o hexassílabo, com rima aBabB;
[2] Segundo Mª. de Lurdes Belchior: «Na lira e nas canções aliradas o número de versos por estrofe vai de 4 a 9 e os versos são de 6 a 10 sílabas, alternando-se segundo o gosto ou capricho do poeta. Liras ou canções aliradas escreveram Garcilaso, Frei Luis de Léon, S. João da Cruz, e entre nós, além de Rodrigues Lobo, Camões, Falcão de Resende, Fernão Álvares do Oriente, e outros.» in Itinerário Poético de Rodrigues Lobo, Imprensa Nacional-Casa da Moeda,Lisboa, 1985, p. 202.