Laura de Anfriso de Manuel da Veiga Tagarro
- poesia e história - helena barbas - Maio 2003
[II – A Obra e a Crítica ]
1. Sobre Laura de Anfriso
1.1 Problemas editoriais
1.2 Aspectos prosódicos
1.3 Os mistérios da escrita
1.4 A escrita como encenação e escultura
] 1.1 Problemas editoriais [
Como atrás se referiu, o volume é composto por uma epístola, quatro ‚éclogas, e seis livros com dez odes cada um. Da edição de Manuel de Carvalho existem exemplares nas Bibliotecas Nacional de Lisboa, da Ajuda, de Évora e na Livraria da Imprensa Nacional.
Segundo Inocêncio, existe um exemplar datado de 1628, diferente deste, uma vez que lhe falta o sexto livro das odes. Aquele autor considera, assim, que a segunda edição do texto, «nova edição, correcta, e emendada.» é a da Typographia Rollandiana, datada de 1788, cujo prólogo diz ser da autoria de Lourenço Caminha. Aí se atribui suavidade e harmonia a Laura de Anfriso, mas se considera que:
... não tem aquele brilhante, de que eram ornados outros Poetas do seu tempo. A linguagem he puramente Portugueza, e sem afectação; porém tem huma belleza, que encanta, move, e arrebata; mas sem escaldar a imaginação do Leitor. Os seus Versos são brandos, e amorosos, mas cheios de decência, e de poesia honesta; abunda de muita moral, e até de política; alguns delles são sentenças, e decisões. [1]
A principal reserva que se pode colocar relativamente a esta edição, para além de algumas, pequenas, discrepâncias de pontuação e ortografia - perigosas por vezes no alterar do sentido das frases - é o facto de os editores terem retirado as notas aos versos que informam a edição de 1627. São estas notas que se afiguram como um dos elementos mais fascinantes e enriquecedores da obra, aspecto que não foi esquecido por Barbosa Machado:
... igoalmente perito na metrificação, como no estudo da Sagrada Escritura, Jurisprudência e Lição de Poetas e Historiadores de cujas autoridades estão cheyas as margens do livro que publicou,... [2]
Para além disso, a edição de 1788 apresenta-se completa nos momentos em que a de 1627 é omissa, e vice-versa. À de 1788 faltam-lhe as folhas 251-252, correspondentes ao início da Ode X do livro VI (8 sextilhas). E foi em confronto com esta edição que primeiro se detectou o desaparecimento dos fols.131/131v. e 132/132v. do texto de 1627.
A edição utilizada para este trabalho é a da Biblioteca Nacional de Lisboa, que se encontra nos Reservados do Fundo Geral sob a cota 215v. Este livro suscita alguns problemas de carácter editorial, tanto no âmbito da paginação, como de discrepâncias nas indicações de rodapé, além de lhe faltarem cerca de duas folhas. As anomalias detectadas, que a seguir se enumeram, levantam a dúvida sobre a possibilidade de se tratar de um engano apenas tipográfico ou um acto mais complexo (censura), seja de simples troca de referências, que não afecta a ordenação dos poemas, seja o caso mais grave de trocas na disposição das estrofes:
1) Repetição ou trocas nos números dos fólios:
- Os fol. 12 e 13 aparecem com o nº 12;
- Os fol. 14 e 15 aparecem com o nº14;
- O fol. 29 apresenta o nº 20;
- O fol. 47 apresenta o nº 44;
- O fol. 54 apresenta o nº 50;
Em todos estes casos a numeração segue correcta, ignorando a repetição ou troca de números. Porém, a partir do Livro II das Odes, que começa no fol. 53, mas que deveria ser o fol. 57, a numeração o segue os dígitos de valor mais baixo, ou seja, o resto da edição está toda numerada a partir do fol.53 (repetindo, portanto, os números de 53 a 57). Daqui surge a hipótese de se terem utilizado e reunido neste livro os fólios de duas edições diferentes.
2) Discrepâncias entre indicação de rodapé‚ e início de estrofe seguinte:
- O fol. 14(/A) dá como indicação "Tu"; a estrofe da página seguinte (fol.14v./A) começa por "Lá nessas..."; a segunda estrofe deste folio começa por "Tu eras..."; Sugere-se a possibilidade de troca na ordem das estrofes;
- O fol. 43 dá como indicação "Oh"; a estrofe da página seguinte (fol.43v.) começa por "O cego...";
- O fol. 44 dá como indicação "Vida"; na página seguinte (fol.44v.) encontra-se uma nova Ode que começa por "Vida inquieta";
- O fol. 69v. dá como indicação "Pos"; a estrofe da página seguinte (fol.70) começa por "Por";
- O fol. 74 dá como indicação "Pisou"; a estrofe da página seguinte (fol.74v.) começa por "Hum odio..."
- O fol. 74v. dá como indicação "Ode"; a página seguinte (fol. 75) contém ainda uma estrofe em continuação do poema anterior;
- O fol. 98 dá como indicação "Já"; a página seguinte (fol.98v.) começa por "Quem...";
- O fol. 108 não apresenta indicação de rodapé;
3) Erro na numeração dos poemas:
- A Ode II aparece com o nº X;
- A Ode VI aparece com o nº IV;
4) Falta de folhas:
- Foram retirados ou arrancados os fólios 125/125v e 126/ 126v., que representam um total de 16 quintilhas (Ode V do Livro VI);
- O mesmo se passa com os fólios 131/131v. e 132/132v., num total de 16 sextilhas (Ode VII do livro VI);
Enquanto no primeiro caso a situação não levanta suspeitas de maior, a ausência dos segundos fólios, pelo teor dos versos, permite a hipótese de uma tentativa de censura ao poema. Tanto mais que, de acordo com o que já acima se referiu, seria o último livro das odes – o sexto – em falta na hipotética edição de 1628.
No total, este livro tem 146 fólios, numerados até ao 140.
[] H.B.[]
[1] Op. Cit. p. iii.
[2] Barbosa Machado, Op. Cit., vol.III, p.401.