Laura de Anfriso de Manuel da Veiga Tagarro - poesia e história - helena barbas - Maio 2003 | ||
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[IV – A Relação Poesia-História]
3.1 A construção da figura de Laura
Pelo que ficou dito, pode afirmar-se que, em Manuel da Veiga Tagarro, sob a figura de Laura, se esconde uma tentativa de condensação das diversas facetas da hipóstase feminina neo-platónica (Laura enquanto Ideia e substituta de Diana-Beatriz-Madonna Laura), a gnóstica (Helena-Maria Madalena), bem como da figura Imperial de Diana-Astreia, numa síntese cristianizada pelo professar da heroína. Ainda, e porque para além de ser associada à revelação, o seu "casamento" com Cristo/Deus traz implicações gnósticas, Laura é igualmente confirmada como personificação da divina Sofia. Encontram-se, então, três facetas da figura de Laura, a primeira, a "material", que corresponderá à amada de Anfriso, na sua fase primitiva, funcionando como "dona" poética mais do pastor que do narrador, e relacionável com o primeiro estádio do caminho para o desengano: Vénus/Primavera; a segunda, a Laura imperial, ainda relacionada com Anfriso, mas metáfora de um anseio de carácter político: é Diana/Astreia; a terceira, já de carácter sagrado e/ou filosófico – seja qual for a perspectiva adoptada (católica ou gnóstica) sempre cristianizada – em que Laura se torna hipóstase do conhecimento: a divina Sofia ou a Ideia neo-platónica. Aqui ainda com uma dupla hipótese decorrente da divisão entre "l'aura gentil" e "l'aura popularis" de Petrarca, sob a figura de Ennoia, ou sob a figura da Pistis Sofia do Valentinianismo. Também o seu percurso pode ser considerado como duplo, se se entender que passa da vida activa – do mundo – à vida contemplativa – do convento, ou do amor humano ao divino.
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